Depois de mais de três décadas o Brasil finalmente instalou, ainda que recortada, a sua Comissão da Verdade. Bastou isso para que a reação se manifestasse.
Declarações surgiram como se há tempos esperassem esse momento em que a possibilidade de resgatar a memória e punir os crimes cometidos pela ditadura encontrasse espaço nos caminhos tortuosos da estrutura governamental. Já que legalmente não foi possível impedi-la, uma nova fase de ataques tem início, provavelmente de maneira mais organizada pelos setores da elite interessados em apagar seus rastros de sangue.
Num primeiro momento, os ataques desferidos pelos Clubes dos militares na reserva foram tratados como ecos de “generais de pijama” que já em sua velhice não estariam falando em nome de uma parcela da elite brasileira. Porém, outras manifestações e opiniões surgiram país afora, desde juristas afirmando a “ilegalidade” da comissão, festas comemorativas do golpe e comentaristas de plantão dos meios de manipulação de massa que salientam a “conciliação” já realizada e que é desnecessária a busca da verdade.
Felizmente, os setores progressistas parecem ter compreendido, ou aceito, que mesmo uma comissão tão recortada pelas forças conservadoras e pela inércia do governo, pode possibilitar um avanço não somente no resgate da memória, mas também numa profunda discussão do papel do Estado brasileiro. Esse deve ser o guia para todas os forças empenhadas em construir um novo país e, a partir disso, mobilizar a sociedade para que os crimes de tortura, assassinato, sequestro, estupro e tantos outros também sejam punidos.
É impossível qualquer avanço na construção de uma sociedade mais justa sem que mais de 20 anos de sua história venham à tona. Deve ficar claro para o povo brasileiro que o maior crime cometido pela burguesia brasileira junto com os militares foi a interrupção do processo de transformações na estrutura do Estado. Para que isso fosse possível, a direita assassinou e torturou milhares de brasileiros e brasileiras que lutaram para que esse país fosse digno do seu povo.
Não há, dentro da analise histórica, a possibilidade de dizer aonde as mudanças em curso naquele período nos conduziriam. Entretanto, é possível afirmar que a interrupção do processo de modo ditatorial pelas elites agravou e aprofundou ainda mais as mazelas deste país e impediu, de maneira violenta, qualquer tentativa de mudança do status quo vigente.
O medo, componente importante da construção do regime, deixou marcas indeléveis nas gerações pós-ditadura. O sentimento do povo em geral com relação às forças de segurança do Estado nos ajudam a entender melhor o que ainda paira no ar. As polícias militares ou civis ainda seguem a risca a “doutrina de segurança nacional”: assassinatos, torturas, sequestros, violência contra os mais pobres e organizações que lutam pela transformação do país. Desvendar o que ocorreu e como foi montada essa imensa estrutura pode contribuir para desmontar o atual formato das polícias que tanta tristeza traz ao povo pobre do Brasil.
Mais “sutil e invisível” do que isso é a manutenção da estrutura de poder das elites. Amparadas pelo imperialismo estadunidense e pelo capital estrangeiro, ainda hoje, inviabilizam a construção de um país soberano. Por mais que o governo negue, são visíveis os mecanismos de bloqueio impostos a quaisquer iniciativas que permitam uma participação mais organizada do povo brasileiro nas decisões pertinentes aos rumos do Brasil, ou nas ações do governo que permitam avançar em alguns pontos na agenda das reformas.
O momento atual necessita da máxima atenção e empenho de nossas organizações, movimentos, partidos, pastorais, centrais sindicais, associações e todos aqueles indivíduos que compreendem que o atual momento histórico deve ser de avanço na consciência de nossa classe. A crise do capital em escala global pode permitir que avancemos para saídas que apontem para um projeto popular que resolva os problemas de nosso povo ou, por outro lado, a saída pela direita, com suas soluções nazi-fascistas que permitem, por exemplo, que os candidatos republicanos a Casa Branca falem abertamente da anexação de Porto Rico aos Estados Unidos.
É o tempo onde a luta de classes começa a mover setores até então paralisados.
É nossa tarefa aproveitar o vento que sopra para empregar nossas forças junto com o povo para que as grandes questões, que podem alterar a correlação de forças na luta de classes, sirvam de exemplo para as batalhas que se aproximam. A História nos convoca mais uma vez, aceitemos o convite. O tempo é nosso.
Pátria Livre, Venceremos!
Anderson Barreto, militante do Levante popular da Juventude - RS
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