Em entrevista à Radioagência NP, a professora e especialista em cultura árabe da Universidade de São Paulo (USP), Alerne Clemesha, fala sobre o histórico do conflito entre os dois povos
Juliano Domingues,
de São Paulo (Radioagência NP)
de São Paulo (Radioagência NP)
O conflito entre Israel e Palestina chega a mais uma fase lamentável. Depois do fim da trégua - que venceu em dezembro do último ano - e a retomada de lançamento de foguetes palestinos no sul de Israel, a faixa de Gaza está sendo novamente ataca pelo exército israelense. Até agora, mais de 500 palestinos foram mortos e o número de feridos ultrapassa os 2,5 mil.
Apesar da crescente pressão internacional, Israel se nega em cessar fogo e conta com apoio do governo dos Estados Unidos (EUA). Os lideres israelenses afirmam que o ataque só cessará quando o Hamas for destruído.
Em entrevista à Radioagência NP, a professora e especialista em cultura árabe da Universidade de São Paulo (USP), Alerne Clemesha, fala sobre o histórico do conflito entre os dois povos e mostra que, ao contrário do que a grande mídia insiste em desmentir, a ação de Israel denota uma política de segregação e extermínio.
Radioagência NP: Alerne. Fale sobre a origem deste conflito.
Alerne Clemesha: O que está acontecendo em Gaza é nada mais que a continuidade da política israelense desde que surgiu o estado de Israel, em 1948. Neste ano, assim que a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a partilha da chamada "Palestina histórica" (engloba Israel, Cisjordânia e faixa de Gaza), as forças sionistas começaram a realizar ataques a vilarejos palestinos de toda a região, forçando a população palestina a fugir. Os israelenses realizaram massacres e fuzilamentos. De 800 vilarejos da Palestina histórica, foram destruídos um total de 530.
Mas há registros de todo esse massacre? E qual a razão desse sionismo?
Isto está muito bem registrado pela chamada nova historiografia israelense. Esse esforço do sionismo era para criar um Estado que fosse puramente judeu. Não havia interesse nenhum na aceitação de diferentes etnias e religiões. Está comprovado que aquilo que aconteceu em 1948 não foi conseqüência de uma guerra. Esses 800 mil palestinos expulsos, do que hoje é a terra de Israel, deixaram para trás tudo que gerações construíram e que fazia parte de sua vida. Hoje a população da faixa de Gaza é de 1,5 milhão, sendo que 1,1 milhão são refugiados. Ou seja, descendentes daqueles que foram expulsos em 1948. Esses também foram para Cisjordânia, para os países árabes ao redor e também para o mundo todo. A partir daí os palestinos passaram a se espalhar sem ter um Estado próprio, e sem ter, até hoje, uma representação própria.
A que você explica essa falta de ação das potências mundiais e organismos competentes em intervir para resolver de vez este conflito?
A própria criação do Estado de Israel teve mais que um fator motivador. Nós comentamos aqui da necessidade de reparar os judeus pelo crime do holocausto, agora outro motivador, provavelmente mais importante porque antecedeu esse, foi o de usar o sionismo como aliado para a dominação dentro do Oriente Médio. Foi assim que começou o apoio britânico ao sionismo antes da Segunda Guerra Mundial. Esse fator continuou ao longo da segunda metade do século XX. Israel continuou a ser o grande aliado dos EUA, depois de ser da Inglaterra, e isso faz com que os EUA agora dêem um apoio incondicional ao Estado de Israel. E essa aliança política de interesses é o que impede que a ONU se encarregue da situação de fato, porque a Assembléia Geral [da ONU] sempre votou que Israel terminasse essa ocupação dos territórios palestinos.
É exagero dizer que há uma política de extermínio do povo palestino?
Não há mais como negar que há um extermínio do povo palestino. Ali você tem uma política de segregação racial que cria um estado de apartheid, além de criar esses bolsões que são hoje guetos palestinos murados, e veja que quando eu uso esse termo não é um exagero. Se você pegar a cidade de Belém, na Palestina, [Cisjordânia] essa cidade tem um muro dando a volta nela. Não tem como entrar e sair de Belém sem a permissão do exército israelense. E depois de toda essa política paulatina de segregação cada vez maior, há a possibilidade absoluta de realizar um massacre.
Como você analisa a figura do Hamas nesse conflito?
O Hamas é um partido político. Independentemente da sua casta de fundação ou teor religioso do partido, o Hamas vem declarando – e a imprensa não divulga – que gostaria de realizar conversas para reconhecer o Estado de Israel. Isto não está escrito na sua carta [do partido], mas eles têm dado declarações. Mas por que não colocam isso na carta? Porque seria com entregar para Israel a única troca que o Hamas teria. Israel ainda não reconhece direito ao Estado palestino. Por mais que se possa criticar o Hamas por seu aspecto religioso, trata-se de um partido. Imagine só se fosse o governo palestino, por exemplo, dizendo que o governo eleito do Likud [partido do ex-primeiro ministro israelense Ariel Sharon] deve ser derrubado por ele ser religioso. Ninguém aceitaria, mas seria exatamente a mesma coisa. Só se aceita isso porque existe na cabeça das pessoas toda uma preparação ideológica para aceitar que o árabe é terrorista.
O Hamas tem apoio da população palestina?
A população palestina não é majoritariamente a favor de um Estado islâmico. Trata-se de uma população laica que até há alguns anos atrás, 96% dela era a favor de um Estado laico e não de um religioso, mas o boicote ao governo eleito do Hamas apenas o fortalece. A grande maioria dos palestinos em Gaza que não eram favoráveis ao Hamas, passam a ser, pois enxergam o seu apoio ao Hamas como uma resistência à Israel.
Apesar da crescente pressão internacional, Israel se nega em cessar fogo e conta com apoio do governo dos Estados Unidos (EUA). Os lideres israelenses afirmam que o ataque só cessará quando o Hamas for destruído.
Em entrevista à Radioagência NP, a professora e especialista em cultura árabe da Universidade de São Paulo (USP), Alerne Clemesha, fala sobre o histórico do conflito entre os dois povos e mostra que, ao contrário do que a grande mídia insiste em desmentir, a ação de Israel denota uma política de segregação e extermínio.
Radioagência NP: Alerne. Fale sobre a origem deste conflito.
Alerne Clemesha: O que está acontecendo em Gaza é nada mais que a continuidade da política israelense desde que surgiu o estado de Israel, em 1948. Neste ano, assim que a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou a partilha da chamada "Palestina histórica" (engloba Israel, Cisjordânia e faixa de Gaza), as forças sionistas começaram a realizar ataques a vilarejos palestinos de toda a região, forçando a população palestina a fugir. Os israelenses realizaram massacres e fuzilamentos. De 800 vilarejos da Palestina histórica, foram destruídos um total de 530.
Mas há registros de todo esse massacre? E qual a razão desse sionismo?
Isto está muito bem registrado pela chamada nova historiografia israelense. Esse esforço do sionismo era para criar um Estado que fosse puramente judeu. Não havia interesse nenhum na aceitação de diferentes etnias e religiões. Está comprovado que aquilo que aconteceu em 1948 não foi conseqüência de uma guerra. Esses 800 mil palestinos expulsos, do que hoje é a terra de Israel, deixaram para trás tudo que gerações construíram e que fazia parte de sua vida. Hoje a população da faixa de Gaza é de 1,5 milhão, sendo que 1,1 milhão são refugiados. Ou seja, descendentes daqueles que foram expulsos em 1948. Esses também foram para Cisjordânia, para os países árabes ao redor e também para o mundo todo. A partir daí os palestinos passaram a se espalhar sem ter um Estado próprio, e sem ter, até hoje, uma representação própria.
A que você explica essa falta de ação das potências mundiais e organismos competentes em intervir para resolver de vez este conflito?
A própria criação do Estado de Israel teve mais que um fator motivador. Nós comentamos aqui da necessidade de reparar os judeus pelo crime do holocausto, agora outro motivador, provavelmente mais importante porque antecedeu esse, foi o de usar o sionismo como aliado para a dominação dentro do Oriente Médio. Foi assim que começou o apoio britânico ao sionismo antes da Segunda Guerra Mundial. Esse fator continuou ao longo da segunda metade do século XX. Israel continuou a ser o grande aliado dos EUA, depois de ser da Inglaterra, e isso faz com que os EUA agora dêem um apoio incondicional ao Estado de Israel. E essa aliança política de interesses é o que impede que a ONU se encarregue da situação de fato, porque a Assembléia Geral [da ONU] sempre votou que Israel terminasse essa ocupação dos territórios palestinos.
É exagero dizer que há uma política de extermínio do povo palestino?
Não há mais como negar que há um extermínio do povo palestino. Ali você tem uma política de segregação racial que cria um estado de apartheid, além de criar esses bolsões que são hoje guetos palestinos murados, e veja que quando eu uso esse termo não é um exagero. Se você pegar a cidade de Belém, na Palestina, [Cisjordânia] essa cidade tem um muro dando a volta nela. Não tem como entrar e sair de Belém sem a permissão do exército israelense. E depois de toda essa política paulatina de segregação cada vez maior, há a possibilidade absoluta de realizar um massacre.
Como você analisa a figura do Hamas nesse conflito?
O Hamas é um partido político. Independentemente da sua casta de fundação ou teor religioso do partido, o Hamas vem declarando – e a imprensa não divulga – que gostaria de realizar conversas para reconhecer o Estado de Israel. Isto não está escrito na sua carta [do partido], mas eles têm dado declarações. Mas por que não colocam isso na carta? Porque seria com entregar para Israel a única troca que o Hamas teria. Israel ainda não reconhece direito ao Estado palestino. Por mais que se possa criticar o Hamas por seu aspecto religioso, trata-se de um partido. Imagine só se fosse o governo palestino, por exemplo, dizendo que o governo eleito do Likud [partido do ex-primeiro ministro israelense Ariel Sharon] deve ser derrubado por ele ser religioso. Ninguém aceitaria, mas seria exatamente a mesma coisa. Só se aceita isso porque existe na cabeça das pessoas toda uma preparação ideológica para aceitar que o árabe é terrorista.
O Hamas tem apoio da população palestina?
A população palestina não é majoritariamente a favor de um Estado islâmico. Trata-se de uma população laica que até há alguns anos atrás, 96% dela era a favor de um Estado laico e não de um religioso, mas o boicote ao governo eleito do Hamas apenas o fortalece. A grande maioria dos palestinos em Gaza que não eram favoráveis ao Hamas, passam a ser, pois enxergam o seu apoio ao Hamas como uma resistência à Israel.
0 Comments:
Post a Comment