Recentemente o Palácio do Planalto determinou que a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) deverá monitorar uma suposta aproximação que estaria ocorrendo entre o MST e o governo do presidente Fernando Lugo, do Paraguai. A preocupação do governo Lula seria com uma tentativa de cooptação dos Sem Terra pelos paraguaios, com o objetivo de apoiar mudanças no Tratado de Itaipu, aumentando o valor da energia paga pelo Brasil, além de renegociar a dívida. Essas mudanças estavam entre as principais promessas de campanha de Lugo nas eleições presidenciais do ano passado.
Em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo - concedida em 8/01 -, o integrante da coordenação nacional do MST, Roberto Baggio, esclarece qual a relação do MST com os povos da América Latina e suas lutas específicas. Leia a seguir.
É verdade que o assunto está em discussão entre assentados e acampados e militantes do MST?
Os militantes do MST se interessam pelos problemas dos povos da América Latina e, ainda mais, pelos problemas de nossos vizinhos. No caso do Paraguai, existe uma ligação histórica. Lembre-se que o Rio Grande do Sul era Guarani e só foi incorporado ao Brasil em 1756, depois que as tropas da Espanha e Portugal, abençoados pelo Vaticano, massacraram os Guaranis, assassinaram seu lider Sepe Tiaraju e os remanescentes foram expulsos para a Argentina e Paraguai. Procuramos distribuir material que explica a situação dos povos de todo mundo, inclusive do Paraguai e a questão de Itaipu. É um direito a todos e todas ter o maior número possível de informação, mas a mídia brasileira não vem cumprindo o seu papel.
Vocês têm simpatia pela causa paraguaia?
Temos simpatia com todos os povos, com os trabalhadores de todo o mundo. Neste momento, estamos solidários ao povo da Palestina. Temos simpatia ao povo da Bolívia que eliminou o analfabetismo depois de 500 anos de dominação. No caso da itaipu, é uma questão de defesa do princípio da soberania nacional e popular sobre os recursos naturais. Assim como defendemos que os recursos do petróleo no pré-sal devem ser usados pelo povo brasileiro, que os recursos minerais, ora apropriados pela Vale, devem garantir melhores condições de vida ao povo brasileiro, defendemos que o povo paraguaio tem direito a 50% da energia produzida pelo Rio Paraná, em Itaipu, e em Yacerta (com a Argentina). Assim como eles tem direito sobre suas terras, e os latifundiários brasileiros que estão espoliando deveriam ser expulsos. Defendemos a reforma agrária no Brasil e no Paraguai. Aliás, a maioria dos latifundiários do Paraguai moram no Brasil e tem terras lá. Os brasileiros sérios que querem trabalhar, moram no Paraguai e já viraram paraguaios e devem receber cidadania paraguaia.
Em termos práticos, que tipo de apoio o MST pode dar à causa paraguaia? Manifestações públicas? Conscientização da população brasileira? Atos em Itaipu?
Vamos seguir informando a nossa base e nos somar com os outros movimentos sociais brasileiros, como a CUT, CTB, Marcha Mundial das Mulheres para esclarecer ao povo brasileiro que o paraguaios tem os direitos a 50% da energia. Até agora, a Eletrobras paga uma bagatela para eles e quem esta ganhando mesmo são grandes grupos econômicos, estrangeiros, que compram barato essa energia para ter lucro.Que tal se os paraguaios resolverem vender a sua energia, para associações de consumidores do povo brasileiro, de São Paulo e Curitiba, pelo preço que a Eletrobrás paga para eles? Aí o povo brasileiro ia ver como eles e nós somos explorados.
Você não acha que, no caso do governo acenar com a bandeira nacionalista, para defender seus interesses em Itaipu, o apoio do MST ao Paraguai pode parecer antipático? Antinacionalista?
Nada é mais nacionalista do que defender a soberania de um povo sobre os seus recursos naturais. Defendemos a soberania do nosso país e de todos os países. Somos contra o imperialismo dos Estados Unidos sobre o Brasil e do Brasil sobre qualquer país da América do Sul. Infelizmente, as elites brasileiras são hipócritas, frouxas e não tem nada de nacionalista. A classe dominante brasileira fala mal dos paraguaios e dos bolivianos, mas não tem a mesma coragem para defender nosso petróleo, dos vergonhosos leilões da ANP, que a Shell, Exxom arrematam. Não tem a mesma coragem para defender nossa água, (explorada pela suez, coca-cola, nestle), nossos minérios de ferro, roubados pela Vale, que não tem nada de nacional- a maior parte de suas ações foram vendidas nos Estados Unidos.
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