Entrevista concedida pela professora de História da PUC-SP, Vera Lúcia Vieira, à Agência Notícias do Planalto. Ela é uma das responsáveis pelo estudo intitulado “Observatório das Violências Policiais – SP”.
ANP - Como se dá a atuação policial como ferramenta repressora do Estado? Em que situações ela entra em cena, segundo o seu estudo?
Vera Lúcia Vieira - A violência da polícia atuando nas pessoas é de tal ordem que mostra, na verdade, que o Estado é violento. Há uma violência institucionalizada. As demandas sociais são criminalizadas e a ação da polícia atua como se estas pessoas que expressam suas necessidades fossem todas criminosas. O índice de mortes por suspeição é uma coisa absurda. Uma suspeição baseada em olhou para a pessoa, achou que ela era suspeita e matou. Achou que a atitude dela era suspeita e matou. E matam vários. Não matam um ou dois. E quando você consolida os dados, levanta informações, você percebe que tipo de pessoas são as mais suspeitas. São as pessoas pobres e negras e que moram nos bairros mais afastados, que se chamam equivocadamente de periferia. Além do que você tem uma categoria que é a impunidade. As pessoas que cometem estes assassinatos estão fazendo isso com o respaldo da legalidade. Então você tem um preconceito que é consolidado nesta ação institucionalizada porque esta polícia não está agindo assim a troco de nada. Ela tem uma orientação, uma diretriz. Isso é uma política que está sendo implantada.
ANP - Qual seria a orientação do Estado para a atuação destes policiais?
VLV - Eu entendo que isto é uma concepção de política. Se você considera que a contravenção social, ou a suspeição, porque aí não se trata nem contravenção social, é uma questão de suspeição. Você orienta a polícia a dizer que ela tem o direito de prender, ou bater, ou matar alguém que tenha alguma atitude suspeita. Esteja ela no horário de trabalho ou fora dele. Isso é uma determinada concepção de política que expressa uma filosofia sobre a coisa pública. Significa que você acha que a violência é um problema da população, que está posta na pessoa. É uma concepção de vida, uma filosofia que está conduzindo esta política que é totalmente preconceituosa, que não reconhece nem considera os fatores de exclusão social, de desemprego e de não acesso aos benefícios sociais e ao que se produz socialmente. Você culpabiliza o pobre pela sua pobreza e se exime de uma análise mais profunda e de tomar decisões que possam vir a resolver de fato os problemas de exclusão social - ou minimizar tais problemas. Não se atua neste sentido, não há nenhuma política que atue neste sentido, pelo contrário, você culpabiliza o pobre e torna-o suspeito de uma agressão, muitas vezes infundada, apenas pela sua condição de pobreza. Eu acho que é uma política de genocídio.
ANP - No decorrer dos estudos, em princípio, ficou questionada a questão da democracia. Qual a conclusão sobre o tema?
VLV - Depois de muitos estudos, muitas reflexões e lendo bastante, nós não temos na realidade uma democracia, nós temos uma autocracia. Porque se nós considerarmos que a democracia é um governo do povo, com o povo, para o povo, pegando esta acepção mais clássica da palavra, e nós temos todo um Estado organizado que atende apenas aos interesses de alguns, um Estado ao qual a maior parte da população não tem acesso, cujos benefícios não existem. Quando o acesso às condições básicas que dizem respeito às coisas públicas, como educação, saúde, habitação, transporte, não são desenvolvidas para que toda a sociedade, que paga os impostos de forma direta e indireta, possa usufruir, nós não temos então uma democracia. A democracia acabou se resumindo a uma questão de apenas votar e delegar ao outro, que vai tomar decisões no seu lugar. Em geral, a sua demanda nem é ouvida. O que você tem é a polícia vindo em cima de você. Então, que Estado democrático é este, que sociedade é esta que nós temos em que as coisas se colocam desta forma?
Vera Lúcia Vieira - A violência da polícia atuando nas pessoas é de tal ordem que mostra, na verdade, que o Estado é violento. Há uma violência institucionalizada. As demandas sociais são criminalizadas e a ação da polícia atua como se estas pessoas que expressam suas necessidades fossem todas criminosas. O índice de mortes por suspeição é uma coisa absurda. Uma suspeição baseada em olhou para a pessoa, achou que ela era suspeita e matou. Achou que a atitude dela era suspeita e matou. E matam vários. Não matam um ou dois. E quando você consolida os dados, levanta informações, você percebe que tipo de pessoas são as mais suspeitas. São as pessoas pobres e negras e que moram nos bairros mais afastados, que se chamam equivocadamente de periferia. Além do que você tem uma categoria que é a impunidade. As pessoas que cometem estes assassinatos estão fazendo isso com o respaldo da legalidade. Então você tem um preconceito que é consolidado nesta ação institucionalizada porque esta polícia não está agindo assim a troco de nada. Ela tem uma orientação, uma diretriz. Isso é uma política que está sendo implantada.
ANP - Qual seria a orientação do Estado para a atuação destes policiais?
VLV - Eu entendo que isto é uma concepção de política. Se você considera que a contravenção social, ou a suspeição, porque aí não se trata nem contravenção social, é uma questão de suspeição. Você orienta a polícia a dizer que ela tem o direito de prender, ou bater, ou matar alguém que tenha alguma atitude suspeita. Esteja ela no horário de trabalho ou fora dele. Isso é uma determinada concepção de política que expressa uma filosofia sobre a coisa pública. Significa que você acha que a violência é um problema da população, que está posta na pessoa. É uma concepção de vida, uma filosofia que está conduzindo esta política que é totalmente preconceituosa, que não reconhece nem considera os fatores de exclusão social, de desemprego e de não acesso aos benefícios sociais e ao que se produz socialmente. Você culpabiliza o pobre pela sua pobreza e se exime de uma análise mais profunda e de tomar decisões que possam vir a resolver de fato os problemas de exclusão social - ou minimizar tais problemas. Não se atua neste sentido, não há nenhuma política que atue neste sentido, pelo contrário, você culpabiliza o pobre e torna-o suspeito de uma agressão, muitas vezes infundada, apenas pela sua condição de pobreza. Eu acho que é uma política de genocídio.
ANP - No decorrer dos estudos, em princípio, ficou questionada a questão da democracia. Qual a conclusão sobre o tema?
VLV - Depois de muitos estudos, muitas reflexões e lendo bastante, nós não temos na realidade uma democracia, nós temos uma autocracia. Porque se nós considerarmos que a democracia é um governo do povo, com o povo, para o povo, pegando esta acepção mais clássica da palavra, e nós temos todo um Estado organizado que atende apenas aos interesses de alguns, um Estado ao qual a maior parte da população não tem acesso, cujos benefícios não existem. Quando o acesso às condições básicas que dizem respeito às coisas públicas, como educação, saúde, habitação, transporte, não são desenvolvidas para que toda a sociedade, que paga os impostos de forma direta e indireta, possa usufruir, nós não temos então uma democracia. A democracia acabou se resumindo a uma questão de apenas votar e delegar ao outro, que vai tomar decisões no seu lugar. Em geral, a sua demanda nem é ouvida. O que você tem é a polícia vindo em cima de você. Então, que Estado democrático é este, que sociedade é esta que nós temos em que as coisas se colocam desta forma?
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